No universo da produção leiteira, o manejo eficiente das camas nos sistemas de confinamento Compost Barn, como a frequência de aeração, deposição de dejetos e reposição de material, são pilares fundamentais para garantir o bem-estar e a saúde das vacas leiteiras.
A cama, composta por materiais como palha, maravalha, serragem, casca de amendoim, casca de café, palha de arroz, entre outros, desempenha um papel crucial, quando manejada de forma adequada e intensiva, na criação de um ambiente propício para o conforto dos animais, possibilitando manter as vacas limpas e secas, além de impactar diretamente na saúde desses animais.
A cama do Compost Barn fornece múltiplas formas para as vacas descansarem, onde muitas vezes essas posições não seriam possíveis em outros sistemas de alojamento, como por exemplo o Free stall.
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Além disso, já foi possível observar que as vacas detêm de uma melhor qualidade de descanso a partir da análise de comportamentos do sono. Essa cama quando bem manejada, promove às vacas uma superfície de descanso seca, o que vai contribuir para vacas e úberes mais limpos.
Nesse texto iremos discutir sobre manejos essenciais para garantir o sucesso do processo de compostagem e também do bem-estar dos animais. Traremos dicas sobre a umidade da cama, o controle de temperatura, a importância da reviragem periódica, bem como a reposição estratégica a fim de manter a qualidade da cama.
Quais são os pontos chaves para um bom funcionamento do sistema?
Sabemos que o Compost Barn exige um criterioso manejo e gerenciamento, e dentre os indicadores de que o manejo da cama está funcionando bem, podemos citar:
- Baixos índices de mastite e Contagem de Células Somáticas (CCS).
- Design correto do galpão, o qual deve ser pensado e elaborado de forma antecipada.
- Garantir uma boa ventilação.
- Densidade adequada de animais, tendo como limite mínimo 9-10m² de cama por vaca, pois abaixo disso o sistema não funciona bem.
- Reviragem frequente da cama.
Esquema dos pontos chaves para sucesso do sistema. Fonte: Black et al. (2014)
Umidade controlada para o bem-estar
Como um dos principais parâmetros que afetam o processo de biodegradação, temos o teor de umidade da cama.
Ao controlar a umidade da cama, asseguramos um ambiente equilibrado para prevenir problemas de saúde, como a mastite ou doenças de casco, os quais impactam diretamente na produção de leite.
Gráfico demonstrando que o aumento da umidade da cama do Compost Barn elevou a incidência de casos de mastite ambiental.. Fonte: Favero et al. Livestock Science 181(2014) 220-230
Estudos já demonstram a susceptibilidade da cama do Compost Barn às condições ambientais que fica exposta, ou seja, observou-se que a umidade da cama aumenta à medida que a umidade relativa do ar também aumenta, o que evidencia a importância de estar atendo a períodos do ano que temos elevação dessa umidade.
Outro ponto importante de entendermos é que o aumento da umidade da cama irá promover uma maior agregação das partículas e também a redução da temperatura, ou seja, será favorecida a compactação e o sistema se torna anaeróbico.
Como controlar a umidade?
- Monitore regularmente a umidade da cama utilizando métodos adequados, sendo um deles podendo ser realizado de forma prática e rápida. Essa avaliação pode ser realizada pegando um punhado de cama na mão e comprimir, caso gotículas de água escorra, apareçam na superfície espremida ou se forme um bloco que não se desfaz facilmente, indica que a cama apresenta umidade elevada e pode ser considerado aumentar a ventilação mecânica no local, a qual auxilia na retirada da umidade superficial da cama ou que a reposição do material é necessária.
- Caso ao realizar a avaliação houver dificuldade de agregar as partículas pode sugerir que a cama está muito seca e com baixa fermentação, podendo ser indicado a inclusão de água na cama para umidificar.
- O ideal é que ao apertar se forme um bloco, entretanto, o mesmo é facilmente e rapidamente desfeito.
Ilustração do teste para avaliação da umidade da cama do Compost Barn, pegando uma amostra da cama, apertando na mão e tendo a formação de um bloco que rapidamente começa a ser desfeito, evidenciando uma umidade adequada da cama. Fonte: Laryssa Mendonça
Uma outra maneira de verificar a adequação da cama envolve avaliar seu nível de umidade, realizando um cálculo direto da matéria seca por meio do uso de um forno de micro-ondas.
Mas como fazer isso?
- Em um recipiente adequado para uso em micro-ondas pese uma amostra homogênea do material da cama;
- O material deverá ser aquecido em ciclos de 3 minutos cada, onde ao final de cada ciclo o material deve ser retirado do micro-ondas e pesado;
- Ao atingir um peso que não é mais alterado por 3 ciclos e pesagens seguidas, significa que não existe mais umidade para ser perdida pelo material;
- Por fim, deve ser realizada a divisão do peso final encontrado pelo peso inicial da amostra, o resultado será o teor de matéria seca da cama.
Exemplo:
Peso inicial: 85g
- Ciclo 1 (3 minutos no micro-ondas): peso final 75g
- Ciclo 2 (3 minutos no micro-ondas): peso final 65g
- Ciclo 3 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
- Ciclo 4 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
- Ciclo 5 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
Teor de matéria seca = peso final da amostra / peso inicial da amostra
Teor de matéria seca = 45 / 85
Teor de matéria seca = 52%
Ou seja, ao longo do processo, a amostra perdeu 48% de umidade, mostrando que o teor de matéria seca da cama está em 52%.
O ideal é manter a umidade entre 40% e 60%, e isso será resultado do equilíbrio entre a quantidade de dejetos, urina e atividade microbiana da cama.
Na busca por manter a umidade adequada, podemos ressaltar alguns pontos importantes:
- O galpão deve possuir lanternim aberto e pé direito alto.
- Correto posicionamento dos ventiladores, os quais irão auxiliar no resfriamento das vacas e na secagem do material da cama.
- Não permitir que as vacas tenham acesso a água através da cama, o ideal é que os bebedouros sejam instalados no corredor de acesso a pista de alimentação.
- Construir entradas curtas ao longo do galpão para que se evite o acúmulo de matéria orgânica nesses locais, além disso, é importante que essas entradas sejam espaçadas a cada 15 metros.
Controle de temperatura
Controlar a temperatura da cama é essencial para proporcionar um ambiente adequado para as vacas. Uma cama na temperatura adequada influência na secagem e sanitização da cama, além de reduzir a demanda de reposição, além dessa temperatura ser frequentemente usada para indicar o sucesso da compostagem.
O calor produzido no processo é resultado do processo metabólico dos microrganismos, e quando temos condições de superaquecimento, os organismos termófilos, aqueles que gostam de calor, são favorecidos e na condição oposta, ou seja, em um ambiente frio, o favorecimento passa a ser dos microrganismos que vivem e se reproduzem em baixas temperaturas, os psicrófilos.
A temperatura do ar pode ser considerada um preditor da temperatura da cama, ou seja, no inverno, quando o ar esfria, o gradiente de temperatura entre o ar e a cama se eleva, ocasionando uma maior perda de calor. Em contrapartida, no verão, esse gradiente de temperatura é reduzido pelo fato do calor perdido para o ambiente ser menor nesta estação do ano.
A que devo me atentar em relação à temperatura?
- Manter a temperatura entre 45 e 60ºC, medindo essa temperatura numa profundidade de 30cm. Nessa faixa de temperatura pode haver a eliminação de microrganismos patogênicos causadores de mastite.
- Temperaturas fora dessa margem trazem consequências para o bem-estar e para a saúde das vacas:
- Acima de 60ºC: reduz os patógenos, mas aumenta a frequência necessária de reposição, além de causar estresse térmico nos animais.
- Abaixo de 45ºC: a cama passará por um processo de semi-compostagem, tem-se maior dificuldade na secagem da cama e ineficiência na sanitização do ambiente.
- Um ponto importante de ser evidenciado é o de que o calor da cama do Compost Barn não é quente o suficiente para matar bactérias, em especial as causadoras de mastite.
- Existem correlações entre a temperatura da cama e a presença de bactérias. Quando temos a cama dentro da faixa máxima de temperatura, temos a presença de Coliformes, E.coli e Staphylococcus.
Gráfico demonstrando a correlação entre as bactérias e a temperatura do Compost Barn. Fonte: Black et al. (2014)
A umidade e a reviragem da cama têm influência direta na temperatura dela. Por esse motivo, em caso de temperatura inadequada, verifique a necessidade de troca das camas e se os passos anteriores estão sendo seguidos adequadamente.
Reviragem periódica para homogeneidade
Revirar a cama é essencial para garantir uma distribuição uniforme da umidade e evitar pontos úmidos na cama. Como já sabemos, a cama muito úmida prejudica a saúde dos animais.
Quando a reviragem é realizada, promovemos a aeração, ou seja, uma maior entrada de oxigênio no material, o que além de ser benéfico pois eleva a atividade microbiana, irá favorecer a perda de umidade para o ambiente, melhorando assim a eficiência do processo de compostagem.
Esse manejo visa promover que a camada mais seca vá para a superfície e a umidade superficial da cama seja incorporada às camadas mais profundas, além também da incorporação de fezes e urina.
É reconhecido que após algumas horas da reviragem da cama ocorre uma queda brusca do nível de oxigênio e a estabilização da temperatura, o que reafirma que para mantermos condições aeróbicas há a necessidade de realizar o revolvimento diário dessa cama.
Como realizar esse processo?
- Realize a reviragem da cama pelo menos duas vezes por dia, aproveitando os momentos em que os animais estão na sala de ordenha.
- Utilize ferramentas apropriadas para garantir uma mistura completa do material. Dentre essas ferramentas temos os escarificadores, que são os mais utilizados para essa função, podendo ser encontrados com ou sem o rolo destorroador, mas também podem ser utilizados as enxadas rotativas e grade a disco.
Escarificador com rolo destorrador. Fonte: JA Saúde Animal
- Atingir todas as camadas da cama é essencial nesse momento, o que indica que a profundidade da reviragem irá depender da altura da cama, pois o intuito é atingir as camadas mais profundas do composto. Entretanto, normalmente temos como meta em grande parte das fazendas a profundidade de 30cm no momento da reviragem.
- Concentre-se em áreas de maior uso para prevenir compactação excessiva, sendo pontos de atenção principalmente as áreas de entrada e saída da cama, ou seja, aquelas áreas que promovem acesso à pista de alimentação e aos bebedouros, pois nesses locais há a tendência de concentrar maior umidade.
- Observe a textura da cama após a reviragem, avaliando a presença ou não de torrões ou até mesmo a formação de muito pó, o que pode indicar condições opostas de umidade que deverão ser ajustadas.
Reposição estratégica para manter a qualidade
Uma estratégia que pode ser utilizada é a reposição estratégica da cama, com intenção de evitar a decomposição excessiva e a perda de propriedades da cama. Esse novo material deverá ser adicionado quando a cama começar apresentar umidade alta e quanto a frequência desse manejo, dependerá também das condições de umidade da mesma.
Quando em condições ideais de umidade e temperatura da cama e reposição da cama é indicada a cada 6 meses a 1 ano, sendo indicado também que se mantenha cerca de 10 a 15cm do composto antigo para que o processo de compostagem seja acelerado no novo material.
Como realizar essa reposição estratégica?
- Reponha a cama regularmente, ajustando conforme necessário. Esse manejo vai ser essencial principalmente em lotes com maior lotação e/ou lotes com maior produção, pois esses animais irão consumir mais e consequentemente estercar mais, elevando a umidade da cama e a compactação;
- Utilize material fresco e de qualidade para repor a cama. Dentre os materiais mais utilizados, temos: maravalha, serragem, casca de café, caca de amendoim e, por fim, a palha de arroz. É importante que a fazenda detenha material extra para realizar reposições quando necessário;
- Monitore a textura da cama e a resposta das vacas para determinar a frequência de reposição.
Mas o que de fato devemos checar frente aos manejos da cama?
- Temperatura: 43- 66°C
- Umidade: 45 – 55%
- Distribuição das vacas no galpão: As vacas estão deitadas ou em pé na cama?
- Sujidade das vacas: As vacas se apresentam sujas ou limpas?
- Mastite clínica e CCS: Qual a incidência de mastite clínica e o resultado de CCS?
Benefícios econômicos e sustentáveis do manejo consciente
Manejar a cama de forma eficiente e sustentável traz algum benefício para a propriedade? A resposta é sim!
Dentre os benefícios podemos citar:
- Melhoria do conforto das vacas.
- Melhoria da limpeza das vacas.
- Melhoria na produção e qualidade do leite (redução da CCS).
- Redução nos custos com tratamentos veterinários devido à prevenção de doenças;
- Maior sustentabilidade econômica e ambiental.
Aumento da produção de leite e significativa redução de CCS. Fonte: Black et al. (2013)
Em resumo, a atenção detalhada ao manejo da cama no sistema de confinamento é um investimento essencial para propriedades de produção leiteira.
Mesmo sabendo que há uma enorme suscetibilidade da cama às condições ambientais a qual fica exposta, o controle desses fatores através do emprego de manejos corretos, devem ser independentes da estação do ano e do clima.
Por isso, o monitoramento e o diagnóstico das variáveis deve ser frequente, pois sabemos que isso afeta diretamente o bem-estar e a saúde.
Ao equilibrarmos a umidade, realizar o revolvimento regular, repor o material adequadamente e controlar a temperatura da cama, os produtores não apenas garantem o conforto dos animais, mas também preservam a qualidade e a quantidade do leite produzido em sua propriedade, o que confere o sucesso do sistema.
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