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Bovinos leiteiros em um pasto

Carrapatos em bovinos leiteiros: saiba como fazer um controle eficiente

Os carrapatos são considerados um grande desafio na bovinocultura de leite, pois podem causar uma série de problemas ao rebanho, afetando a saúde dos animais, o seu desempenho e produtividade e consequentemente trazendo prejuízos econômicos à atividade leiteira.

Dessa forma, conhecendo os seus impactos nas fazendas, o seu controle é considerado um dos grandes problemas da pecuária nacional.

Existem mais de 920 espécies de carrapatos descritas em todo mundo, porém, para nós, existe um de maior importância, o Rhipicephalus microplus, popularmente conhecido como “carrapato-do-boi”.

Bovino com diversos carrapatos

Bovino parasitado pelo carrapato Rhipicephalus microplus / Fonte: Acervo pessoal Rehagro

 

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Prejuízos econômicos causados pelos carrapatos

Segundo a Embrapa, os prejuízos econômicos anuais chegam a superar a marca dos 3 bilhões de dólares, contabilizando queda de produção (até 90 litros em uma lactação de 300 dias), gasto com medicamentos, infecções secundárias e mortes.

Um ponto importante que contribuiu para os prejuízos causados é a resistência dos carrapatos aos produtos acaricidas comerciais, o que de forma crescente vem se tornando um desafio.

A utilização inadequada pode levar a seleção de carrapatos resistentes, promovendo a sobrevivência deles, os quais ao se reproduzirem são capazes de transmitir essa característica aos descendentes, favorecendo a perpetuação do gene que confere a resistência.

A cada aplicação de acaricida uma pressão de seleção artificial é exercida nos carrapatos, onde, nem todos os carrapatos vão ser susceptíveis ao tratamento com o produto utilizado. Isso ocorre pelo fato de que alguns carrapatos apresentam mutações de maneira aleatória e natural, o que contribui para a sobrevivência dos mesmos.

Ciclo biológico e fatores ambientais

Para entendermos quais as melhores formas de controle do R. microplus, precisamos entender o ciclo do carrapato, sendo este, dividido em duas etapas, fase parasitária e fase não parasitária e seu ciclo completo dura de 21 a 28 dias, podendo ter variações dependendo das condições ambientais.

Fase parasitária

A fase parasitária corresponde ao período em que a fêmea passa parasitando seu hospedeiro, alimentando de sangue, neste caso, há predileção pelos bovinos, com preferência por Bos taurus, indo desde a fixação das larvas no hospedeiro, até seu estádio adulto, onde as teleóginas (fêmeas ingurgitadas) se desprendem e caem no ambiente.

Fêmea do carrapato ingurgitada

Fêmea R. microplus ingurgitada / Fonte: Reprodução Internet

Fase não parasitária

Neste momento se inicia a fase não parasitária, ou de vida livre, se estendendo desde o desprendimento da teleógina do seu hospedeiro, ovipostura (uma fêmea pode produzir de 4.000 a 5.000 ovos durante a sua vida), incubação dos ovos, a qual é feita em locais protegidos como nas pastagens, vegetação ou abrigos próximos.

Após cerca de 20 a 30 dias em condições satisfatórias de temperatura e umidade, os ovos eclodem, ocorre a “maturação” das larvas, até estarem prontas para subir no hospedeiro.

Nessa fase, elas possuem um tamanho de 0,5mm de comprimento e normalmente se mantêm na vegetação e ficam à espera da passagem do seu hospedeiro.

Após o contato, as larvas se prendem ao hospedeiro e começam a se alimentar de sangue e depois de alguns dias de alimentação as larvas caem do hospedeiro e se abrigam novamente no ambiente, onde realizam a ecdise (muda) se transformando em ninfas.

Já no estágio de ninfa, o qual é considerado um estágio intermediário entre larva e adulto, elas são um pouco maiores do que as larvas e após cerca de três semanas, buscam novamente os animais para se hospedar.

Após essa fase, as ninfas também se desprendem do hospedeiro e vão de abrigar no ambiente, onde ocorrerá novamente a ecdise e cerca de uma semana após o desprendimento do hospedeiro elas já estarão transformadas em adultos.

Pós-Graduação em Pecuária Leiteira

Carrapatos adultos

Os carrapatos adultos são maiores, medindo entre 4 e 5 mm de comprimento, sendo os machos um pouco menores. Nessa fase eles voltam ao hospedeiro para se alimentar, reproduzir e completar o ciclo.

Para obter nutrientes suficientes para a produção de ovos, as fêmeas se alimentam de sangue por um período prolongado de tempo (10 a 20 dias) e após isso elas se desprendem do hospedeiro, procuram um lugar adequado para depositar seus ovos, encerrando então o ciclo biológico.

Ciclo de vida do carrapato Rhipicephalus microplus

Ciclo de vida do carrapato Rhipicephalus microplus / Fonte: Bimeda

Impactos dos carrapatos na saúde dos bovinos

Os carrapatos são considerados um grande problema para a produção de leite por diversos fatores, os quais impactam de forma direta na saúde, bem-estar e no desempenho dos animais. Dentre esses fatores, podemos citar:

Efeitos na saúde dos animais

A presença do carrapato gera desconforto aos animais, o que culmina no estresse dos mesmos. Por se alimentarem de sangue eles injetam substâncias anticoagulantes e irritantes na pele dos bovinos, o que causa coceira e irritabilidade nos animais.

Esse estresse culmina na redução da produção de leite dos animais, pois o consumo, comportamento alimentar e metabolismo serão alterados.

Uma única fêmea detém a capacidade de sugar aproximadamente 0,5 ml de sangue por dia, e quando pensamos em um animal infestado de 200 fêmeas, o que é um número relativamente pequeno, ele pode perder até 1 litro de sangue em apenas duas semanas.

Diante disso, é notório que a alimentação prolongada e abundante de sangue pode causar anemia nos animais, o que se somada ao estresse contribuem prejudicando o seu desempenho e a lucratividade do negócio.

Transmissão de doenças

Os carrapatos podem ser vetores de diversas doenças, dentre elas a Tristeza Parasitária Bovina (TPB), causada pelos agentes parasitários Babesia e Anaplasma, as quais são consideradas graves problemas na pecuária leiteira.

Babesiose

O ciclo biológico da doença tem início no carrapato, mais diretamente durante o repasto sanguíneo, onde o é iniciado todo ciclo do agente parasitário.

  • Infecção do carrapato: no ato de se alimentar de sangue, ocorre a ingestão de sangue de um animal contaminado, contendo a forma infectante, os chamados merozoítos, os quais irão penetrar as células intestinais do carrapato. 
  • Liberação de gametas: os eritrócitos irão se romper em seu trato gastrointestinal, liberando então os gametas e ocorrendo posteriormente a fecundação dando origem ao zigoto. Os zigotos vão para a corrente sanguínea do carrapato e se desenvolvem em oócitos, atingindo células de vários órgãos. 
  • Invasão de glândulas salivares e infecção do hospedeiro: Quando os ovários são atingidos, a multiplicação contínua nos tecidos das larvas eclodidas e quando atinge as glândulas salivares, logo na primeira alimentação da larva, ocorre a transformação em esporocistos e em seguida esporozoítos, os quais infectam um novo hospedeiro. 

Ciclo biológico da Babesia sp.

Ciclo biológico da Babesia sp. / Fonte: Juliana Gomes da Silva, 2016.

Anaplasmose

Não diferente do ciclo da babasiose, o ciclo de vida da Anaplasma marginale ocorre tem início no carrapato, e dentro do ciclo evolutivo, podemos descrever as seguintes etapas:

  • Infecção do carrapato: Durante o processo de alimentação, a forma infectante, os chamados merozoítos estarão presentes, os quais irão penetrar nas células intestinais do carrapato.
  • Multiplicação inicial (Forma reticulada): Nas células intestinais ocorre a transformação dos merozoítos em células maiores, os corpúsculos elementares, os quais se multiplicam por divisão binária dentro das células do carrapato.
  • Diferenciação em corpúsculos basais (Forma densa): Após terem ocorridas várias divisões celulares, esses corpúsculos elementares são transformados em corpúsculos basais, os quais são maiores e de formato arredondado.
  • Invasão de glândulas salivares: Corpúsculos basais migram do intestino médio dos carrapatos para as glândulas salivares.
  • Infecção do hospedeiro: No ato de repasto sanguíneo, ao se alimentar as bactérias presentes nas glândulas salivares são transmitidas para o hospedeiro, onde, de forma infectante, os merozoítos entram nos eritrócitos.
  • Replicação intracelular: Nas células do bovino, os merozoítos multiplicam e se transformam nos corpúsculos de inclusão, os quais continuam a se dividir dentro dos eritrócitos infectados, aumentando assim a carga bacteriana no animal.

Ciclo biológico da Anaplasma marginale

Ciclo biológico da Anaplasma marginale / Fonte: Adaptado de Kocan et al., 2003 e Hajdusek et al., 2013.

Conhecendo então o ciclo de vida do carrapato e os problemas que os mesmos podem trazer para a atividade leiteira, é importante entender sobre as condições ideais para a sobrevivência e proliferação desses vetores.

As condições ambientais propícias para a multiplicação dos carrapatos incluem altas temperaturas e umidade do ar, o que se resume em épocas de chuva e calor.

Como a proliferação do carrapato está ligada a fatores ambientais, regiões que têm estações chuvosas bem definidas atreladas a altas temperaturas, tende a ser favorável para o aumento da população do carrapato nessas épocas.

Em regiões de clima temperado, como é a região sul do Brasil e demais regiões com maior altitude, é conferido ao carrapato uma flutuação no ciclo de vida, o que contribui para uma instabilidade enzoótica da tristeza parasitária bovina (TPB).  

Estratégias de controle dos carrapatos

Para se obter um controle eficiente de carrapatos é preciso estabelecer uma estratégia, unindo o uso dos acaricidas ao chamado, controle estratégico. Não basta apenas comprar o produto e utilizar nos animais quando a infestação estiver alta e fazer esse uso de forma descontrolada.

Sabemos que muitas gerações de carrapatos vêm se tornando resistentes a determinadas bases químicas, justamente pelo uso incorreto desses produtos.

Para isso, é muito importante conhecer e determinar a utilização da ferramenta denominada Teste de Resistência dos Carrapatos (Biocarrapaticidograma).

Esse teste é feito com o intuito de demonstrar a resistência aos principais grupos químicos de carrapaticidas disponíveis, como os organofosforados, piretróides, amitraz, ivermectina, fipronil e associações.

Para isso, um passo a passo deve ser seguido:

  • Coleta: coletar mais ou menos 200 carrapatos grandes de vários animais e com pelo menos 21 dias após a última aplicação de produto de controle.
  • Armazenamento: os carrapatos devem ser acondicionados em recipientes limpos (garrafas de água mineral, por exemplo), identificados e com pequenas perfurações que permitam a entrada de ar.
  • Importante: os carrapatos devem chegar ao laboratório em até 48 horas após a coleta, caso contrário o teste não poderá ser realizado.

Ao final, o teste irá predizer bases que são eficazes e que deverão ser utilizadas.

A recomendação é que após a indicação da base química correta, ela seja utilizada por um ano consecutivo associada a correto manejo de utilização e seguindo as recomendações dos fabricantes, podendo após esse período ser feita alternância de produto por outro que demonstrou eficácia no teste.

Entretanto, quando se pensa em alternância de produtos, é comum observarmos os produtores realizando trocas rápidas de produtos, por exemplo utilizar um produto diferente em cada mês, o que não é recomendado, visto que essa alternância excessiva contribui ainda mais na pressão de seleção dos carrapatos e consequentemente na resistência dos mesmos.

É importante ressaltar que em grande parte dos casos, associada a alternância de produtos temos os erros de manejo, o que afeta agravando o problema, pois de nada adianta ter a base química correta e fazer mau uso. Dentre esses erros de manejos podemos citar:

  • Diluição incorreta (em casos de produtos de pulverização);
  • Dosagem sem pesar o animal (em casos de produtos Pour On);
  • Aplicação de forma incorreta;
  • Contenção incorreta;
  • Equipamentos adequados (em casos de pulverização);
  • Condições climáticas;
  • Intervalos de aplicação.

Sabemos que a maior parcela dos carrapatos está hospedando os animais e que a grande parte deles (95%) estarão no ambiente, como as pastagens e por isso além de atentar e trabalhar no controle dos carrapatos também no ambiente.

Pesquisadores da Embrapa fizeram uma abordagem inovadora nesse aspecto, onde os experimentos testaram formulações granulares secas do fungo Metarhizium robertsii aplicadas nas pastagens.

É ressaltado que esse agente de biocontrole não causa a morte imediata do carrapato, mas causa uma infecção letal. Além disso, as aplicações nas pastagens atingiram mais efetivamente a população de carrapato, além de que elas previnem ou minimizam os períodos iniciais do ciclo do carrapato.

Entretanto, por se tratar de experimentos, já existem trabalhos visando a melhoria da formulação a fim de minimizar os efeitos deletérios que foram identificados neste estudo e contribuir para o controle dos carrapatos.

Considerações finais

É nítido o grande problema que a infestação por R. microplus traz a toda cadeia produtiva do leite, sendo necessário a conscientização dos produtores e colaboradores sobre a forma correta de trabalhar com estratégias de controle, buscando minimizar os prejuízos causados pelo parasita.

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Laryssa Mendonça

Felipe Gabarra - Equipe Leite Rehagro

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