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Vaca leiteira apresentando claudicação

Escore de claudicação em vacas leiteiras: como realizar a avaliação?

Nos últimos 20 anos, a produção de leite tem experimentado um crescimento notável, superando a marca de 2,2 mil litros por vaca anualmente. Considerando o tamanho do rebanho, o Brasil se destaca como um dos principais produtores de leite do mundo. 

Esse distinto aumento na produtividade está diretamente associado à prática de produção intensiva de bovinos leiteiros, que abrange melhorias significativas no âmbito genético, nutricional e na adoção de tecnologias de produção mais avançadas.

Contudo, em paralelo ao avanço na intensificação dos sistemas de criação e produção de leite, observou-se um aumento significativo nos problemas locomotores em bovinos nos últimos anos. Essa questão emergiu como uma das principais causas de declínio na produtividade dos rebanhos leiteiros no país.

Nesse contexto, a claudicação surge como um dos principais sinais clínicos relacionados às afecções locomotoras.

Entretanto, é importante salientar que a claudicação não é um sintoma específico e, muitas vezes, não se manifesta inicialmente em casos de alterações locomotoras.

Isso ocorre porque podem existir causas multifatoriais, abrangendo traumas, fatores genéticos, questões nutricionais, doenças infecciosas, condições metabólicas e distúrbios neurológicos.

Por que o animal claudica?

A claudicação é uma alteração visível tanto em movimento quanto em repouso (conhecida como claudicação estática). Durante a locomoção, essa alteração se manifesta como uma marcha irregular, envolvendo as fases de elevação, avanço, contato e apoio, em um ou mais membros.

Além disso, ela pode estar acompanhada ou não de modificações na postura, como o arqueamento da região dorsal, podendo apresentar aumento de volume e lesões visíveis, ou não.

Ademais, pode ser um sinal proveniente de desconforto doloroso, insensibilidade em um ou mais membros afetados ou perturbações neuromusculares que interferem na fluidez do movimento e na adaptação às fases ou períodos de repouso.

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Causas de claudicação: fatores infecciosos

Apesar da complexidade etiológica e da inespecificidade desse sinal clínico, as principais causas de claudicação estão frequentemente associadas a fatores infecciosos, por afecções podais primárias ou secundárias.

Em primeiro plano, essas infecções estão relacionadas a doenças bacterianas que afetam a estrutura do casco, sendo as mais agressivas as provocadas por Dichelobacter nodosus e Fusobacterium necrophorum.

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Causas de claudicação: fatores nutricionais e inflamatórios

Além das causas infecciosas, as causas nutricionais e inflamatórias podem proporcionar o meio viável para agressão bacteriana.

A pododermatite asséptica difusa, comumente chamada de laminite, é notoriamente associada a fatores nutricionais, em especial a Acidose Ruminal Subaguda (SARA).

Essa condição pode ser desencadeada pelo consumo de uma dieta com alto teor de concentrado, resultando na produção de ácidos graxos voláteis pela microbiota ruminal, provenientes da fermentação dos carboidratos não fibrosos, juntamente com baixos níveis de Fibra em Detergente Neutro (FDN). Esses fatores combinados resultam na redução do pH no rúmen e no intestino.

A acidificação do meio leva ao desequilíbrio na microbiota ruminal, resultando em um aumento significativo das bactérias acidificadoras produtoras de ácido lático. Essas bactérias danificam a parede do rúmen, causando micro lesões que podem permitir a passagem de endotoxinas para a corrente sanguínea, desencadeando um processo de inflamação sistêmica.

A inflamação sistêmica move um complexo processo de irregularidades hemodinâmicas, que resultam do aumento de polipeptídeos ou glicoproteínas pró-inflamatórias. Essas alterações afetam a circulação sanguínea nas extremidades, incluindo os cascos.

Esse efeito subsequente leva à redução do fornecimento de nutrientes e oxigênio para a camada coriônica das lâminas dérmicas. Uma das consequências disso é o comprometimento da formação da arquitetura e da composição da camada de queratina dos cascos, tornando-os menos resistentes e menos capazes de lidar com fatores externos, como traumas e agentes patogênicos.

Animal apresentando arqueamento de dorsal

Animal apresentando arqueamento de dorsal, inclinação de cabeça e impotência funcional do membro pélvico esquerdo, em estação. Foto: Eliel Scavazzini Neves

Outros fatores

Existem outros fatores que desempenham um papel significativo na ocorrência e prevalência de enfermidades nos cascos e dentre elas, podemos citar:

  • Densidade do rebanho;
  • Traumas;
  • Pisos irregulares;
  • Falta de higiene e alta umidade do ambiente;
  • Fatores congênitos como aprumos desalinhados e espessura reduzida de coxim digital.

Escore de claudicação

Estima-se que entre 80% e 90% das afecções estejam localizadas distalmente às articulações cárpicas e társicas, com a maioria delas afetando os dígitos. Dessas, 76% a 84% das lesões ocorrem nos membros pélvicos, devido a fatores como mudanças na inércia, na propulsão e na complexidade das articulações e músculos em comparação com os membros torácicos.

Além disso, a maioria das lesões se concentra nos dígitos laterais desses membros, devido à distribuição de força ser maior no eixo do dedo V.

Imagem demonstrando a distribuição do peso do animal nos membros

Imagem demonstrando a distribuição do peso do animal nos membros, evidenciando a maior disposição de força se concentrando nos dígitos laterais. Foto: João Paulo Elsen Saut

Sendo assim, foram desenvolvidas metodologias visuais e classificatórias para uma avaliação apropriada das condições clínicas de deambulação, levando em consideração as características da marcha dos bovinos e sua postura.

Essa avaliação é baseada em dois critérios:

  1. Análise da postura e posicionamento do animal em repouso, o que é definido como claudicação em repouso. Isso envolve observar mudanças no centro de gravidade e arqueamento do dorso.
  2. Análise em movimento, que avalia as fases das passadas, a postura, assimetria e fluidez do animal durante o deslocamento.

Essas metodologias são frequentemente chamadas de escores de claudicação ou locomoção, mas todas elas são fundamentadas em um sistema de classificação numérica por meio de pontuações.

A mais comum utiliza uma escala de 5 pontos, na qual o escore 1 representa um animal sem claudicação, enquanto o escore 5 indica animais com claudicação grave, caracterizada pela impotência funcional de um ou mais membros.

Sistema de classificação numérica para vacas leiteiras

Sistema de classificação numérica para vacas leiteiras

Sistema de classificação numérica para vacas leiteiras. Fonte: traduzido e adaptado de Flower e Weary (2006)

Como realizar a avaliação do escore de claudicação?

Para a realização desta e de outras avaliações faz-se necessários três etapas:

  • Etapa 1: A avaliação do animal parado permite observar o posicionamento do dorso (arqueamento do dorso, sinal de dor), a mudança do centro de gravidade de um ou mais membros, a posição dos pés em abdução ou adução, e membros torácicos cruzados (indicativos de fratura da terceira falange na unha medial).
  • Etapa 2:  A segunda etapa envolve a avaliação dinâmica da locomoção em um piso duro e deve ser realizada em um local plano, sem obstáculos, com poucas distrações visuais e sonoras, e espaço suficiente para que o animal possa fazer pelo menos 4 passadas com cada membro. Nesta etapa, avaliam-se todos os critérios de movimentação.
  • Etapa 3:  A terceira etapa envolve a avaliação dinâmica da locomoção em um piso macio, permitindo uma compreensão mais precisa da altura da lesão. Quando a claudicação é significativamente aliviada ou reduzida ao caminhar em superfícies macias, em comparação com superfícies duras, isso sugere que o desconforto está associado a regiões mais distantes do(s) membro(s) afetado(s).

Animal apresentando postura de membros torácicos cruzados

Animal apresentando postura de membros torácicos cruzados, decorrente de uma fratura da terceira falange na unha medial. Fonte: Blowey (2015)

Classificação de claudicação

Classificação da claudicação. Fonte: Adaptação da tabela de Sprecher efetuada por Cook, Universidade de Wisconsin-Madison (2001).

Por que é importante saber?

A utilização de técnicas de classificação de locomoção são uma ótima ferramenta de triagem nos rebanhos leiteiros, visto sua aplicabilidade eficiente baseada na observação.

Contudo é importante ressaltar que mesmo animais com boa mobilidade podem estar sofrendo de alguma lesão podal, uma vez que em certas afecções, a manifestação da claudicação ocorre tardiamente em ruminantes.

Além disso, é fundamental entender que o exame de claudicação é um indicativo, não uma ferramenta única de diagnóstico por si só.

Para um diagnóstico preciso, é necessário a avaliação de um especialista e também a realização de outros exames, como palpação, avaliação de lesões de sola, radiografias, ultrassonografia e avaliações locomotoras mais detalhadas.

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Eliel Scavazzini - Equipe Leite Rehagro

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