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Ruminite: o que é e como afeta a saúde do rebanho?

Bovinos leiteiros se alimentando com dieta de qualidade

A ruminite é uma das principais doenças digestivas que afetam bovinos leiteiros, especialmente aqueles submetidos a dietas ricas em concentrados e pobres em fibra efetiva.

Essa condição inflamatória do epitélio ruminal compromete a absorção de nutrientes, reduz a produtividade dos animais e pode levar a complicações graves, como abscessos hepáticos.

Neste artigo, exploraremos os principais aspectos da ruminite, seus impactos no desempenho dos rebanhos leiteiros e estratégias de prevenção e manejo nutricional.

O que é a ruminite?

A ruminite é um processo inflamatório do epitélio ruminal e dos tecidos subjacentes deste órgão e que geralmente é causada por desequilíbrios na dieta.

Na análise macroscópica post mortem a ruminite é caracterizada pela presença de mucosa hiperêmica, hemorrágica ou ulcerada em consequência do baixo pH ruminal no saco ventral do rúmen ocasionado pela produção excessiva de ácidos graxos voláteis (AGVs) e ácido lático.

O rúmen possui uma microbiota equilibrada que fermenta os alimentos e libera energia para o animal. No entanto, alterações bruscas na dieta podem levar ao crescimento excessivo de bactérias produtoras de ácido lático, como Streptococcus bovis e Lactobacillus spp., que agravam a acidificação do ambiente ruminal e iniciam o processo inflamatório.

Além disso, a inflamação prolongada pode reduzir a capacidade do epitélio ruminal de se regenerar adequadamente, agravando ainda mais os danos ao sistema digestivo do animal.

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Existe relação da ruminite com a paraqueratose ruminal?

A paraqueratose ruminal é uma condição caracterizada pelo espessamento anormal do epitélio do rúmen, resultante da exposição prolongada a um ambiente ácido.

Esse distúrbio está intimamente relacionado à ruminite, pois ambas as patologias compartilham a mesma etiologia: dietas ricas em carboidratos de rápida fermentação e baixa fibra efetiva.

Quando a ruminite se instala, a inflamação da mucosa do rúmen leva a um processo de cicatrização que pode resultar na hiperqueratinização do epitélio. Esse espessamento reduz a capacidade de absorção dos ácidos graxos voláteis, agravando ainda mais a ineficiência alimentar do animal.

Além disso, a paraqueratose cria um ambiente propício para a colonização bacteriana e a formação de abscessos hepáticos, um dos desdobramentos mais graves da ruminite crônica.

Vacas leiteiras acometidas por esses distúrbios frequentemente apresentam redução na ingestão alimentar devido ao desconforto associado às lesões ruminais. Esse fator, aliado à baixa absorção de nutrientes, compromete a produção de leite e afeta negativamente o metabolismo do animal, podendo levar a perda significativa de peso e menor eficiência reprodutiva.

Portanto, a prevenção da ruminite também é essencial para evitar a instalação da paraqueratose ruminal, reforçando a necessidade de um manejo nutricional adequado e monitoramento constante da saúde ruminal.

Avaliação do rúmen de bovinos

Avaliação macroscópica do rúmen de bovinos e classificação de acordo com o grau de lesão diagnosticada no exame post mortem. A) rúmen sem lesão. B) rúmen hiperêmico. C) rúmen ulcerado. D) rúmen com hiperqueratose. Fonte: Viana, 2022. 

Quais são as causas da ruminite?

A ruminite está diretamente relacionada ao manejo alimentar inadequado, onde podemos citar como as principais causas:

1. Dietas ricas em concentrado e pobres em fibra

O fornecimento excessivo de concentrados sem a devida quantidade de fibra efetiva reduz a mastigação e a produção de saliva, a qual possui bicarbonato e atua como tampão natural para o pH do rúmen.

Dessa forma, o grau da inflamação e de lesão vai depender do grau da acidose que gerou o quadro e de qual foi o tempo em que o rúmen sofreu os danos da redução excessiva de pH.

2. Acidose ruminal subclínica e crônica

A acidose é considerada a principal causa associada à ruminite. Em casos subclínicos, a queda do pH ocorre de forma intermitente, gerando inflamação crônica da mucosa ruminal, reduzindo a capacidade de absorção de ácidos graxos voláteis (AGVs).

A acidose crônica também está associada a outras complicações metabólicas, como a redução na função imunológica dos animais e o aumento da suscetibilidade a infecções.

3. Alteração brusca na dieta

Mudanças rápidas na alimentação, como a introdução abrupta de grãos na dieta, dificultam a adaptação da microbiota ruminal, favorecendo a acidificação do meio e o desenvolvimento da ruminite. A adaptação gradual à dieta é essencial para manter um ambiente ruminal saudável e funcional.

4. Baixa ingestão de forragem de qualidade

Forragens de baixa qualidade, com baixa taxa de digestibilidade, não estimulam adequadamente a ruminação e a salivação, contribuindo para a redução do pH ruminal. Além disso, dietas com forragem insuficiente podem afetar a motilidade do rúmen, comprometendo a eficiência digestiva e resultando em um maior risco de acidose e ruminite.

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Qual a relação da ruminite com a dieta de alta energia?

Vacas que possuem um desafio nutricional mais intenso são mais predispostas a quadros de acidose ruminal. Nestes casos as dietas altamente energéticas aumentam a fermentação e ocorre uma grande produção de AGVs (propiônico e lático principalmente) e o pH que normalmente fica entre 5,5 a 6,5 cai gradativamente de acordo com o grau da acidose.

Essa mudança provoca uma disbiose na microbiota ruminal e redução da proteção mucosa do epitélio, predispondo a danos químicos decorrentes da inflamação e acidez.

Esse desequilíbrio favorece o crescimento de fungos e principalmente bactérias prejudiciais para o animal que irão causar lesão do tecido epitelial tais como Fusobacterium necrophorum e Trueperella pyogenes. 

Os próprios agentes patogênicos envolvidos no processo causam irritação do tecido epitelial além de liberar endotoxinas e lipopolissacarídeos que irão gerar a inflamação e lesão local e surgimento da paraqueratose.

Eventos resultantes da acidose ruminal

Sequência de eventos resultantes da acidose ruminal após ingestão de grande quantidade de concentrado. Fonte: Adaptado de Nocek, 1997.

Principais impactos da ruminite

A ruminite tem um impacto significativo na produtividade dos rebanhos, podendo resultar em:

Lesões no rúmen

A inflamação causa danos na mucosa ruminal, como ulcerações e necrose (morte do tecido).

Pode levar à paraqueratose ruminal, que é o espessamento e endurecimento da parede do rúmen, dificultando a absorção de nutrientes.

Redução na eficiência digestiva

Com a mucosa do rúmen comprometida, a capacidade de digestão e absorção de nutrientes é reduzida.

Queda na produção de leite

A redução na absorção de nutrientes e no aproveitamento da energia pelos animais leva a uma queda na produção de leite, comprometendo a rentabilidade da propriedade. Vacas leiteiras necessitam de um rúmen saudável para otimizar a conversão alimentar e garantir uma produção eficiente ao longo da lactação.

Impacto no bem-estar

O desconforto gerado pela ruminite compromete o bem-estar dos animais, levando a dor crônica e alterações no comportamento alimentar. Vacas que sentem desconforto tendem a reduzir a ingestão de alimentos, agravando ainda mais as consequências metabólicas da doença.

Comprometimento do sistema imunológico

Animais com ruminite crônica podem ter seu sistema imunológico enfraquecido, tornando-os mais suscetíveis a outras infecções e doenças.

Sinais clínicos da ruminite

Os sinais clínicos do animal com ruminite não são específicos da doença mas de forma geral vão levar o animal a quedas de desempenho. Geralmente os sinais apresentados por um animal com ruminite podem ser:

  1. Redução no apetite e perda de peso: Um dos primeiros sinais é a perda de interesse na alimentação, especialmente em rações concentradas. A incapacidade de digerir e absorver nutrientes adequadamente leva ao emagrecimento progressivo do animal.
  2. Diminuição da produção de leite: Em vacas leiteiras, a produção de leite pode cair drasticamente devido à má absorção de nutrientes e ao desconforto digestivo.
  3. Comportamento de desconforto abdominal: Animais com ruminite podem apresentar sinais de desconforto abdominal, como inquietação e arqueamento do dorso.
  4. Fezes anormais: As fezes podem se tornar mais líquidas ou conter restos de alimentos mal digeridos, indicando uma digestão inadequada.
  5. Diminuição da ruminação: A ruminação (mastigação do bolo alimentar) pode diminuir ou parar completamente.

Existe relação com a formação de abcessos hepáticos?

A inflamação decorrente dos quadros de acidose promove o recrutamento de leucócitos no rúmen, sendo estes responsáveis pela liberação de substâncias vasodilatadoras como a histamina.

Essa vasodilatação do epitélio associada com a redução do muco protetor da mucosa facilita que as bactérias piogênicas passem para a corrente sanguínea assim como as endotoxinas produzidas por elas num processo chamado de translocação bacteriana.

Estes microrganismos tendem a se instalar em regiões muito vascularizadas como o fígado e dessa forma causando a formação de abscessos (agregados de células mortas, bactérias e leucócitos).

Como prevenir a ruminite no rebanho?

A principal forma de prevenir a ruminite é via dieta tendo como princípio o balanceamento dos níveis de energia e proteína de acordo com a categoria. Para isso, existem alguns cuidados importantes como:

  • Balanceamento do teor de fibra na dieta;
  • Adaptação dos animais a dietas densamente energéticas;
  • Monitoramento constante de dieta.

Conclusão

A ruminite é uma doença multifatorial que afeta a saúde e o desempenho dos rebanhos leiteiros. Sua relação com a paraqueratose ruminal reforça a importância de um manejo nutricional adequado, prevenindo desequilíbrios metabólicos e garantindo a longevidade produtiva dos animais.

A adoção de estratégias como a manutenção do pH ruminal, a oferta de fibra de qualidade e a monitorização constante são essenciais para evitar prejuízos e promover o bem-estar animal. Investir no equilíbrio nutricional adequado dos bovinos é fundamental para garantir eficiência produtiva e sustentabilidade no setor leiteiro.

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Autor: Gabriel Murta – Equipe Rehagro Leite

Referências

  • Neto A. F. G.. RUMINITE, ABSCESSOS HEPÁTICOS E ENFERMIDADES PODAIS EM BOVINOS: avaliação dos achados após o abate. UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL. GOIÂNIA 2018.
  • Carrara T. V., Locatelli L. , Oliveira C. A. , Millen D. D.. Distúrbios digestivos em bovinos alimentados com dietas de altos teores de energia. VII SIMPÓSIO DE CIÊNCIAS DA UNESP – DRACENA 2011.
  • Viana P. R. L.. Descrição macroscópica e microscópica das lesões ruminais em bovinos confinados. 2022, Cienc. Anim. Bras., V23, e-73109P.
  • Filho A. D. F. N.. ACIDOSE RUMENAL BOVINA. UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL. GOIÂNIA 2011.

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