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Leptospirose em bovinos leiteiros: sintomas, prevenção e impacto na produção

A leptospirose é uma das doenças mais subestimadas da bovinocultura leiteira, apesar de seus impactos diretos sobre a reprodução, a produção de leite e a saúde do rebanho.

Causada por bactérias do gênero Leptospira, essa zoonose representa um desafio técnico contínuo para médicos veterinários e consultores sanitários, especialmente em sistemas tropicais com elevada pressão ambiental. Ao mesmo tempo, trata-se de uma enfermidade de difícil percepção, marcada por infecções subclínicas, perdas silenciosas e recorrência em propriedades que não adotam um programa preventivo robusto.

Neste artigo, você encontrará um guia técnico completo e atualizado sobre leptospirose em vacas leiteiras, com foco em fisiopatogenia, sinais clínicos, diagnóstico, impactos econômicos e estratégias práticas de controle e prevenção.

 

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Por que a leptospirose é um desafio na bovinocultura leiteira?

A leptospirose é uma zoonose de ampla distribuição mundial, causada por bactérias do gênero Leptospira, que acomete diversas espécies animais, incluindo o ser humano. Na pecuária leiteira, trata-se de uma enfermidade altamente prevalente, com impactos diretos sobre a eficiência reprodutiva, produtividade do leite e saúde pública.

Abortos, natimortos, partos prematuros, retenção de placenta, infertilidade e queda na produção leiteira estão entre os efeitos mais relevantes. Apesar disso, infecções subclínicas são frequentes, dificultando o diagnóstico precoce e favorecendo a manutenção do agente no rebanho.

Além das perdas zootécnicas, a leptospirose é uma doença ocupacional importante, afetando trabalhadores rurais, veterinários e demais profissionais que atuam no campo.

Para que o profissional veterinário atue com eficácia no controle da leptospirose, é fundamental compreender os fatores de risco, o comportamento fisiopatológico do agente, os sinais clínicos, os métodos diagnósticos e as estratégias preventivas disponíveis.

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Agente etiológico e principais sorovares no Brasil

As leptospiras patogênicas são espiroquetas gram-negativas do gênero Leptospira. Possuem mobilidade ativa, morfologia espiralada e capacidade de penetração tecidual acentuada.

Nos bovinos, o sorovar Hardjo (especialmente a variante Leptospira borgpetersenii Hardjo-bovis) é considerado adaptado à espécie, causando infecção crônica com excreção urinária prolongada e impactos reprodutivos discretos, porém persistentes.

Outros sorovares, como Pomona, Grippotyphosa e Icterohaemorrhagiae, são considerados acidentais, frequentemente associados a quadros agudos mais severos e surtos hemorrágicos.

A correta identificação do(s) sorovar(es) circulante(s) é essencial para o sucesso do controle, especialmente na escolha vacinal e na vigilância reprodutiva.

Fatores de risco e formas de transmissão

A infecção ocorre principalmente por contato com urina contaminada, via mucosas ou pele lesionada. A bactéria também pode ser transmitida por:

  • Ingestão de água ou alimentos contaminados;
  • Transmissão venérea ou transplacentária (em infecções por Hardjo);
  • Contato com ambientes úmidos e sujos.

Fatores de risco comuns em sistemas leiteiros

  • Presença de poças, lama ou áreas alagadas;
  • Drenagem deficiente e cochos com vazamento;
  • Convivência com roedores ou suínos sem barreiras;
  • Falta de quarentena para animais adquiridos;
  • Uso de utensílios e equipamentos compartilhados entre lotes.

Segundo Raghavan et al. (2011), fazendas com drenagem precária têm risco até três vezes maior de surtos de leptospirose.

Fisiopatogenia: como a Leptospira age no organismo bovino?

Após penetrar no organismo, a leptospira dissemina-se via corrente sanguínea (leptospiremia), atingindo múltiplos tecidos.

Principais órgãos-alvo

  • Rins: colonização tubular – excreção crônica na urina;
  • Fígado: necrose hepatocelular – icterícia e aumento de enzimas hepáticas;
  • Sistema reprodutivo: aborto, morte embrionária, infertilidade e natimortos.

Mesmo após resolução clínica, a excreção urinária pode persistir por semanas ou meses (Ellis, 2015), tornando o animal um portador crônico e fonte de contaminação ambiental.

Boqvist et al. (2002) relataram que vacas infectadas por Hardjo apresentaram redução na taxa de concepção e aumento no número de dias abertos.

Impactos econômicos da leptospirose na pecuária leiteira

A leptospirose bovina tem um efeito econômico significativo, ainda que frequentemente subestimado nas propriedades.

Seus impactos ocorrem de forma direta, por perdas reprodutivas e queda de produção, e indireta, como aumento do intervalo entre partos, custo com tratamentos e descarte precoce de vacas.

Estudos apontam que:

  • A infertilidade associada à leptospirose pode aumentar em até 20 dias o intervalo entre partos;
  • Abortos causados por sorovar Hardjo estão entre as principais causas de prejuízo reprodutivo em rebanhos tropicais (Boqvist et al., 2002);
  • A queda na produção de leite durante infecções subclínicas pode ultrapassar 10% por lactação (Ellis, 2015);
  • O custo médio por animal infectado pode ultrapassar R$ 300 a R$ 500/ano em propriedades intensivas.

Além disso, a doença reduz a longevidade produtiva da vaca e compromete indicadores sanitários em programas de exportação ou certificação.

Sinais clínicos e impactos reprodutivos

Forma aguda (Pomona, Icterohaemorrhagiae)

  • Febre alta, apatia, anorexia;
  • Hemoglobinúria, icterícia;
  • Abortos no terço final da gestação;
  • Mortalidade em bezerros e vacas lactantes.

Forma subclínica (Hardjo)

  • Infertilidade funcional;
  • Aumento de dias abertos;
  • Retenção de placenta, reabsorção embrionária;
  • Nascimento de bezerros fracos.

Martins et al. (2020) documentaram prejuízos reprodutivos significativos mesmo em rebanhos assintomáticos.

Diagnóstico e controle da leptospirose

Métodos laboratoriais principais

  • MAT (Soroaglutinação microscópica): padrão ouro, mas não diferencia vacinados de infectados;
  • PCR: detecta DNA bacteriano, útil na identificação de portadores (sêmen, urina);
  • Cultura: pouco sensível e lenta, uso restrito à pesquisa.

Hamond et al. (2015) demonstraram a eficácia do PCR na detecção de leptospiras em sêmen de touros. Levett (2001) recomenda interpretação integrada com contexto clínico e exames pareados.

Controle sanitário e estratégico

  • Vacinação periódica com vacinas multivalentes;
  • Quarentena e exames prévios em novos animais;
  • Controle de roedores e drenagem eficiente;
  • Organização e higiene nos ambientes de manejo.

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Prevenção: estratégias práticas para rebanhos leiteiros

  1. Vacinação sistemática: Duas doses iniciais + reforços anuais ou semestrais.
  2. Ambiência e manejo: Eliminar poças, corrigir vazamentos, drenar áreas úmidas.
  3. Controle de roedores: Uso de iscas, armadilhas, barreiras físicas.
  4. Monitoramento sanitário: Sorologia e PCR em reprodutores e suspeitos.

Salgado et al. (2014) demonstraram redução na taxa de abortos com vacinação regular + controle ambiental eficaz.

Conclusão

A leptospirose deve ser considerada uma doença reprodutiva, ambiental e econômica, que exige atuação técnica contínua e estruturada. Seu controle requer um diagnóstico preciso, tratamento estratégico e um engajamento técnico e educativo com a equipe da fazenda.

E você já avaliou o risco de leptospirose no rebanho que acompanha?

Inclua a doença no seu protocolo sanitário, implemente triagens e revise os esquemas vacinais com base em dados reais do rebanho.

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Débora Avelar - Equipe Leite Rehagro

Laryssa Mendonça

Referências:

  • Boqvist, S. et al. (2002).The effect of Leptospira hardjo infection on reproductive performance in dairy cattle. Preventive Veterinary Medicine
  • Ellis, W. A. (2015). Animal leptospirosis. Veterinary Microbiology, 172(3–4), 449–456
  • Levett, P. N. (2001). Leptospirosis. Clinical Microbiology Reviews, 14(2), 296–326
  • Hamond, C. et al. (2015). Detection of leptospiral DNA in the semen of bulls by real-time PCR. Acta Tropica, 146, 64–68
  • Martins, G. et al. (2020). Soroprevalência e impacto reprodutivo da leptospirose bovina. Brazilian Journal of Veterinary Research and Animal Science
  • Salgado, M. et al. (2014). Use of a commercial vaccine to control leptospirosis in dairy herds. Veterinary Record, 175(10), 250

1 comentário

  • Boa tarde eu gostaria de saber de voces se administram curso de ordenha mecanica,automatizada, cuidados com higienização, qualidade do leite e como avaliar e tecnico em equipamentos de ordenha.
    Sou veterinario mas nessa area sinto dificuldade em me qualificar só vejo curso ead e isso para mim acho muito ruim.
    Fico no aguardo
    Obrigado