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Vacas leiteiras se alimentando

Síndrome do jejuno hemorrágico: um desafio emergente para a pecuária leiteira

Você já ouviu falar sobre a Síndrome do Jejuno Hemorrágico (SJH)? Essa síndrome é uma condição intestinal relativamente nova e extremamente letal em vacas adultas, que vem gerado grande preocupação entre produtores de leite, veterinários e nutricionistas.

Também conhecida como a doença da morte súbita, trata-se de uma enterite necro-hemorrágica aguda e esporádica. Embora sua causa exata ainda não seja completamente compreendida, a doença é comum em vacas leiteiras altamente produtivas.

Geralmente, a SJH afeta vacas adultas durante o início da lactação, mas pode ocasionalmente ser observada no período seco ou no final da lactação.

A doença é caracterizada por enterite hemorrágica, especialmente na porção proximal do intestino delgado, frequentemente com coágulos de sangue no lúmen. Se manifesta com hemorragias súbitas e progressivas, às vezes intensas, no intestino delgado, resultando em obstrução devido à formação repetida de coágulos.

Nesse artigo vamos tratar da Síndrome do Jejuno Hemorrágico, evidenciando os principais fatores que podem levar a ocorrência da síndrome, os impactos provocados na produção de leite, os principais sinais clínicos, como diagnosticar e o que encontramos de alterações na necropsia.  

Quais são os impactos na produção de leite?

Estudos relatam que ainda há muito a ser descoberto sobre a condição.

Observa-se que, entre os produtores de leite, há uma variação significativa no conhecimento sobre a doença: alguns nunca a encontraram, outros a enfrentam ocasionalmente em suas fazendas, e há aqueles que lidam com a condição de forma constante ou nunca tiveram conhecimento dessa doença.

Sendo assim, essa síndrome causa grandes perdas na produção de leite. A doença reduz drasticamente a produção, podendo até interromper temporariamente a lactação, exigindo um período de recuperação.

Além disso, provoca perda de condição corporal e aumenta os custos com tratamento intensivo. A alta taxa de mortalidade leva à perda total da produção de leite das vacas afetadas, impactando negativamente a rentabilidade das propriedades leiteiras.

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Quais são os sinais clínicos da SJH?

A Síndrome do Jejuno Hemorrágico (SJH) apresenta sinais clínicos que progridem rapidamente, podendo levar à morte súbita ou iminente. A doença é marcada por uma enterotoxemia severa e hemorragia significativa no intestino delgado, resultando em alterações patológicas graves.

Os principais sintomas da SJH são:

  • Apatia repentina;
  • Sinais de desidratação;
  • Redução no apetite e na produção de leite;
  • Inchaço e dor abdominal;
  • Ausência de defecação ou fezes escuras com sangue coagulado;
  • Vocalização.

Com isso, sinais como decúbito, contrações musculares involuntárias, extremidades podem estar frias, mucosas pálidas, aumento da frequência respiratória e cardíaca (acima de 90-120 batimentos por minuto) e atonia ruminal são comuns.

É comum os animais afetados apresentarem inicialmente os sinais de obstrução do intestino delgado, com subsequente distensão abdominal e presença de melena das fezes. O contorno abdominal da vaca, quando vista por trás, geralmente assume uma forma arredondada ou de pêra.

A bactéria C. perfringens tipo A, um dos agentes causadores da SJH, produz gases que se acumulam no intestino delgado, podendo causar dilatação do abomaso ao se moverem de forma retrógrada do duodeno para o abomaso. Esse acúmulo de gases pode explicar o som de “ping” ouvido no lado direito do abdômen em 75% dos casos, e também porque as vacas com SJH são inicialmente confundidas com deslocamento de abomaso à direita.

O exame transretal pode revelar um cólon dilatado, ceco inflado, rúmen distendido e alças intestinais dilatadas. À medida que a doença avança, podem ocorrer peritonite, necrose intestinal e choque séptico, levando à morte em poucas horas ou até dois dias após o início dos sintomas.

Há relatos de morte súbita sem sinais clínicos prévios. A duração da doença é geralmente de 2 a 4 dias, e, mesmo com tratamento intensivo, os animais tendem a piorar, ficando debilitados, permanecendo deitados e morrendo, ou sendo submetidos à eutanásia.

Animal apresentando sinais clínicos da Síndrome do Jejuno Hemorrágico

Imagem de um animal apresentando sinais clínicos da Síndrome do Jejuno Hemorrágico. Fonte: Débora Avelar

Como diagnosticar o quadro?

O diagnóstico da Síndrome do Jejuno Hemorrágico (SJH) é feito com base em sintomas clínicos, exames laboratoriais, exame retal e ultrassonografia transabdominal.

A ultrassonografia pode identificar a distensão das alças intestinais por gás ou líquido, e o íleo é confirmado pela presença de sangue coagulado e hemorragia, entretanto, sabemos que seu uso da ultrassonografia para diagnóstico a campo é pouco utilizado.

Para excluir outras causas de obstrução intestinal, como indigestão, enterite e vólvulo, é necessário um diagnóstico diferencial cuidadoso. A distensão intestinal pode ser detectada no exame retal, e a laparotomia exploratória ajuda a distinguir a SJH de outras condições como intussuscepção.

Devido à incerteza sobre a causa exata da SJH, o diagnóstico é desafiador e geralmente se baseia em achados clínicos, ultrassonográficos e de necropsia, além de excluir outras enterites hemorrágicas, como salmonelose e diarreia viral bovina.

O que irei encontrar na necropsia?

Exames cirúrgicos e pós-morte em bovinos com Síndrome do Jejuno Hemorrágico frequentemente revelam uma distensão acentuada do intestino delgado, com descoloração da superfície serosa para vermelho-escuro ou roxo.

Também é comum a desvitalização do jejuno e, ocasionalmente, do duodeno. O lúmen intestinal pode conter sangue com ou sem coágulos, e a mucosa intestinal frequentemente se desprende.

Nos casos mais graves, o intestino se apresenta inchado e frágil, com coágulos sanguíneos semelhantes à gelatina e presença de fibrina na serosa do jejuno. Durante a necropsia, podem ser encontrados grandes coágulos de sangue e áreas de enterite necro-hemorrágica no intestino delgado.

A presença de coágulos de sangue no lúmen intestinal, um achado específico da SJH, é observada em apenas 19% das vacas afetadas. O prognóstico é ruim, com uma taxa de mortalidade próxima de 100%, apesar do tratamento intensivo.

Recomenda-se o uso de aditivos alimentares, bom manejo nutricional e administração de vacinas para o controle da doença.

As principais alterações histopatológicas incluem edema e hemorragia na submucosa, especialmente no jejuno, além de ulceração, necrose, e um infiltrado inflamatório rico em neutrófilos que leva ao desprendimento do epitélio.

Em estágios avançados, a destruição da mucosa se estende por toda a espessura da parede intestinal, com hemorragias graves na submucosa, camada muscular e serosa.

Embora o tratamento seja intensivo e custoso, o prognóstico para os animais afetados pela síndrome continua a ser desfavorável.

Imagens de necropsia de um bovino

Imagens de necropsia de um bovino onde é possível observar o intestino delgado distendido, serosa do jejuno com coloração bem avermelhada, presença de fibrina e lúmen intestinal contendo sangue. Fonte: Débora Avelar

Quais possíveis fatores levam a ocorrência da Síndrome do jejuno hemorrágico?

A Síndrome do Jejuno Hemorrágico é uma doença relativamente comum em bovinos de leite e de corte, com alta taxa de mortalidade.

Entretanto, a causa da doença não está totalmente clara, com a patogênese ainda não muito compreendida, porém as possíveis causas mais citadas envolvem tanto fatores infecciosos quanto condições metabólicas e nutricionais:

  1. Infecção por Clostridium perfringens tipo A é sugerido como o principal agente causador, com suas toxinas alfa e beta 2 desempenhando um papel importante na doença, pois são capazes de provocar necrose e hemorragia intestinal. Além disso, por ser uma bactéria comum no ambiente e no trato digestivo dos bovinos, os fatores de estresse ou alterações na dieta podem favorecer seu crescimento excessivo. A dieta parece ser o principal fator predisponente para o desenvolvimento da síndrome.
  2. A infecção por Aspergillus fumigatus também é sugerida por alguns autores como uma possível associação a SJH. Em animais infectados com A. fumigatus, a gliotoxina, um potente agente imunossupressor e adaptogênico, foi estudada. Ela potencializa a virulência de A. fumigatus, suprime os mecanismos de defesa do hospedeiro, apoia a virulência do fungo e, por fim, pode levar à SJH.

A prevenção da SJH é fundamental, pois sabemos que a evolução da doença é rápida e com alta taxa de mortalidade.

Mesmo que as causas exatas da doença não sejam totalmente conhecidas, medidas preventivas podem contribuir na redução dos riscos. Essa prevenção inclui principalmente manejos nutricionais e sanitários.

  • Manejo nutricional: Nesse manejo é importante que transições abruptas na alimentação, em especial nas dietas ricas em concentrados sejam evitadas, pois existe a possibilidade de ocorrer desequilíbrios intestinais e deixar o animal mais suscetível a SJH. Além disso, a garantia de uma fibra de qualidade na dieta é essencial, visto que isso contribui tanto para a saúde ruminal como a intestinal. Ainda relacionada à fibra, é importante evitar o fornecimento de silagens mal fermentadas, as quais podem haver presença de fungos e suas micotoxinas e prejudicar o sistema digestivo dos bovinos. O uso de probióticos podem contribuir para a microbiota intestinal e assim evitar o crescimento exacerbado de bactérias patogênicas, como é o caso do C. perfringens e assim prevenir as disbioses, ou seja, os desequilíbrios que podem predispor a SJH.
  • Manejo do estresse: É importante ressaltar o quanto o estresse eleva a vulnerabilidade dos animais a diversas doenças. Quando temos um manejo realizado prezando a máxima redução do estresse, como o de evitar superlotação e transporte inadequado, por exemplo, estamos contribuindo para a redução do estresse.
  • Vacinação: Mesmo que não seja uma vacina específica para a SJH, o uso de vacinas contra Clostridium perfringens tipo A e demais toxinas bacterianas podem contribuir reduzindo o risco de surtos em rebanhos susceptíveis.

Considerações finais

Sabemos então que a SJH é uma doença grave de bovinos leiteiros de alta produção, com elevada mortalidade, de multifatoriedade e que ainda necessita de melhor compreensão e estudos.

Entretanto, devido às suas potenciais causas, temos a prevenção sendo a melhor estratégia, pois o tratamento é limitado e em muitos casos sem sucesso.

Com o alinhamento de um manejo alimentar adequado, enfatizando a saúde digestiva, aliada a medidas preventivas de minimização do estresse metabólico, estaremos trabalhando no caminhão para reduzir a incidência desse problema.

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Débora Avelar - Equipe Leite Rehagro

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