Rehagro Blog

Rotavírus em bezerras leiteiras: sintomas, controle e prevenção

Bezerra leiteira deitada em um alojamento

Entre os agentes infecciosos mais relevantes que causam diarreia em bezerras, o rotavírus bovino (BRV) destaca-se pela alta prevalência em bezerras com menos de 30 dias de vida, frequentemente associado a surtos em rebanhos leiteiros. Estima-se que a prevalência global varie entre 20% e 60% em amostras de fezes de bezerros com diarreia, com maior incidência na primeira semana de vida (Geletu et al., 2021).

Esse vírus pertence à família Reoviridae, apresenta genoma segmentado de RNA fita dupla e grande diversidade genética, sendo os grupos A, B e C os mais associados à doença em bovinos, com predominância do grupo A (Torres-Medina et al., 1985; Geletu et al., 2021).

Neste artigo, serão abordados de forma detalhada os aspectos etiológicos do rotavírus bovino, seus mecanismos patofisiológicos na indução da diarreia e as principais estratégias de controle e prevenção aplicáveis em sistemas de produção de leite.

Etiologia do rotavírus em bezerras

O rotavírus bovino (BRV) é um vírus não envelopado da família Reoviridae, com genoma composto por 11 segmentos de RNA fita dupla, responsáveis pela codificação de seis proteínas estruturais (VP1 a VP4, VP6 e VP7) e seis não estruturais (NSP1 a NSP6).

Essa estrutura segmentada confere ao agente alta capacidade de variabilidade genética por meio de mutações e eventos de rearranjo (do inglês reassortment), contribuindo para a diversidade de cepas circulantes em bovinos e outros hospedeiros.

A classificação do rotavírus é baseada na proteína VP6, altamente antigênica, que permite a distinção em sete grupos principais (A–G), além de grupos emergentes. Entre esses, o grupo A é o mais prevalente em bezerros e está associado à maioria dos casos clínicos de diarreia neonatal, embora os grupos B e C também possam ser detectados em campo.

A transmissão do BRV ocorre predominantemente pela via fecal-oral, sendo a principal fonte de infecção as fezes de animais infectados.

Bezerras são particularmente suscetíveis nas primeiras semanas de vida, devido à imaturidade imunológica e à dependência de imunidade passiva conferida pelo colostro (Foster & Smith, 2009). Além disso, a elevada resistência ambiental do vírus facilita a ocorrência de surtos em propriedades leiteiras.

E-book Criação de bezerras leiteiras

Patofisiologia da infecção por rotavírus

O rotavírus apresenta tropismo pelos enterócitos maduros da borda em escova do intestino delgado, principalmente no jejuno e íleo.

Após a ingestão do vírus, a partícula viral é ativada por enzimas proteolíticas do trato gastrointestinal, como a tripsina, o que aumenta a infectividade e facilita a penetração viral nas células epiteliais.

Lesão das vilosidades

A replicação viral ocorre no citoplasma dos enterócitos, resultando em alterações metabólicas e subsequente descamação das células infectadas para o lúmen intestinal. Esse processo leva à atrofia e fusão de vilosidades, substituídas por células imaturas de origem criptal, que são funcionalmente incapazes de realizar absorção e digestão adequadas (Torres-Medina et al., 1985).

Diarreia osmótica e malabsortiva

A perda de enterócitos maduros implica em queda acentuada da atividade de enzimas digestivas, como as dissacaridases, resultando no acúmulo de lactose e outros carboidratos não digeridos no lúmen intestinal. Esse conteúdo sofre fermentação bacteriana, elevando a pressão osmótica intraluminal e agravando a diarreia.

Papel da proteína NSP4

Além da ação destrutiva direta, a proteína NSP4 do rotavírus atua como uma enterotoxina viral, promovendo alterações na homeostase do cálcio intracelular e estimulando secreção de água e eletrólitos para o lúmen intestinal. Dessa forma, o mecanismo da diarreia por rotavírus é misto, combinando fatores malabsortivos e secretórios (Gomez & Weese, 2017).

Consequências sistêmicas

O resultado final desses processos é a ocorrência de diarreia aquosa, desidratação e acidose metabólica, frequentemente agravadas por coinfecções com E. coli enterotoxigênica ou Cryptosporidium parvum. A intensidade do quadro clínico depende do equilíbrio entre a destruição epitelial, a resposta imune do hospedeiro e a pressão de infecção ambiental (Torres-Medina et al., 1985; Geletu et al., 2021).

Controle e prevenção do rotavírus em bezerras

O controle da rotavirose em bezerras depende sobretudo da redução da pressão de infecção no ambiente, já que o vírus apresenta alta resistência, podendo permanecer viável por um período acentuado. Dessa forma, a manutenção de instalações limpas, secas, bem ventiladas e com baixa densidade animal, associada ao uso de utensílios rigorosamente higienizados para o fornecimento de leite e água, é determinante para evitar surtos.

As medidas de biosseguridade, como o controle do trânsito de pessoas e equipamentos entre maternidade e bezerreiros, complementam esse manejo ambiental, sendo fundamentais para conter a disseminação viral. A colostragem adequada e a vacinação de vacas secas contra rotavírus reforçam a proteção das bezerras ao garantir maior imunidade passiva no período de maior susceptibilidade.

Como realizar o tratamento?

O tratamento da diarreia causada por rotavírus é essencialmente de suporte, uma vez que não existem antivirais específicos. A prioridade é a fluidoterapia oral ou intravenosa, ajustada conforme o grau de desidratação e acidose metabólica. Soluções eletrolíticas com glicose favorecem a absorção de sódio e energia, auxiliando na recuperação.

O fornecimento contínuo de leite não deve ser interrompido, pois contribui para o aporte nutricional e energético. Antimicrobianos não são indicados rotineiramente, mas podem ser utilizados em situações de coinfecções bacterianas ou septicemia. Medidas de suporte, como o uso de probióticos, podem auxiliar na restauração da microbiota intestinal.

Conclusão

A rotavirose é uma das causas mais frequentes de diarreia neonatal em bezerras leiteiras, resultando em elevada morbidade e impacto econômico significativo para os sistemas de produção.

O vírus atua de forma direta sobre os enterócitos maduros do intestino delgado, levando à atrofia de vilosidades, má absorção e diarreia osmótica, potencializada pela ação enterotoxigênica da proteína NSP4. O resultado é um quadro de diarreia aquosa, desidratação e acidose metabólica, frequentemente agravado por coinfecções bacterianas e protozoárias.

O manejo ambiental e a biosseguridade devem ser entendidos como os pilares da prevenção, reduzindo drasticamente a pressão de infecção no rebanho. Associadas a essas práticas, a colostragem adequada e a vacinação de vacas secas contra rotavírus funcionam como ferramentas adicionais para reforçar a imunidade das bezerras nos primeiros dias de vida.

Embora não haja tratamento específico, a fluidoterapia e o suporte nutricional são fundamentais para a recuperação clínica e para evitar complicações fatais.

Dessa forma, compreender os mecanismos etiológicos, patofisiológicos e preventivos da rotavirose permite ao médico veterinário adotar medidas eficazes de controle, contribuindo não apenas para a redução da mortalidade neonatal, mas também para a preservação do potencial produtivo das futuras vacas leiteiras.

Transforme sua forma de produzir leite com conhecimento aplicado

Produzir mais e melhor não depende apenas de investir em tecnologia ou aumentar a estrutura da fazenda. O verdadeiro diferencial está em dominar os números e saber tomar decisões estratégicas que impactam diretamente na produtividade e no lucro.

A Pós-graduação em Pecuária Leiteira do Rehagro foi criada para te mostrar, passo a passo, como aplicar técnicas modernas de gestão e produção que já transformaram a realidade de centenas de produtores e consultores em todo o Brasil.

Banner Pós-graduação em Pecuária Leiteira

Autoria: Equipe Leite Rehagro

Comentar